A discussão sobre a circulação de carretas no perímetro urbano vem se arrastando por vários anos. Não fosse a abordagem irresponsável e a frieza com que alguns tratam o tema, talvez eu não me atrevesse a comentar a respeito. Minha posição é muito mais provocativa no sentido de organizar o pensamento para que da nossa realidade se postule uma alternativa que seja satisfatória tanto para a eficiência da atividade fim dos profissionais caminhoneiros, tanto como para a garantia da segurança no trânsito dos nossos munícipes.
Campo Novo do Parecis vive um drama que alguns municípios experimentam: a passagem no perímetro urbano de uma rodovia federal, BR 364, e uma rodovia estadual, a MT 235. Muito provável que um senhor ou uma senhora que tenha suas preocupações diárias com seu meio familiar não tenha tempo e nem obrigação de saber que existe regulamentação por meio da lei que estabelece competência e circunscrição para cada via, que versa sobre a sinalização, manutenção e fiscalização, embora eles sejam alcançados por complicações como essa na movimentação nas vias, seja na condição de pedestre, ciclista ou motorista, pois o que interessa a ele ou a ela é a sua segurança.
Esse interesse pela segurança, mesmo sendo uma reivindicação justa, tem causado questionamento de forma equivocada, o insulto e até a demonização dos caminhoneiros a cada Boletim de Ocorrência de acidente que envolve uma carreta estacionada numa das vias da cidade, como se as carretas estacionadas fossem por si só responsáveis por acidentes de trânsito. Frases como “tem que tirar essas carretas da cidade”, “essas carretas estragam as ruas”, “essas carretas atrapalham”, são ouvidas como reclamações para que o poder público tome providências a respeito. Daí a polêmica é somada com a circulação, parada e a operação de carga e descarga. Quem passa pela BR 364 –Olacyr Francisco de Moraes- reclama das carretas estacionadas ao lado do canteiro central, alegando com razão que é infração conforme art. 181 inc. VIII do Código de Trânsito Brasileiro, e exige a retirada ou autuação por conta das longas filas de carretas estacionadas no local. Se estacionarem ao lado direito, não seria de igual modo uma situação simpática aos caminhoneiros, uma vez que as fachadas dos comércios seriam obstruídas, deixando os comerciantes desconfortáveis com isso, produzindo outras mais reclamações.
Temos duas realidades das quais não podemos negar: a) somos um município essencialmente agrícola que demanda transporte para escoar a produção e, portanto, o trânsito de carretas, e b) não há ainda no município uma infraestrutura suficiente destinada à parada e estacionamento de carretas, o que induz as mesmas a compartilharem das vias urbanas com os demais veículos e usuários.
Outrossim, há quem exige a sinalização de regulamentação de proibição de circulação de carretas no quadrilátero central e a regulamentação de horário para carga e descarga. O Decreto Executivo nº 072 de novembro de 2005, que define as diretrizes do Sistema Viário do Município, que regulamenta a Lei Complementar nº 007/2003, à época, visava atender esse propósito. Evidente que a estrutura física e a logística para o transporte em 2019 é muito mais intensa que em 2003, tendo em vista o crescimento e o desenvolvimento na região.
Para organizar e regulamentar áreas de estacionamento em via pública, o CONTRAN por meio da Resolução 302 estabeleceu os critérios e os tipos, entre eles, a área destinada para operação de carga e descarga. Esta área, sendo implantada pelo órgão competente com circunscrição sobre a via, servirá para atender a localidade da via onde for destinada, não sendo, portanto, uma exclusividade do comércio A ou B. A implantação de área para operação de carga e descarga é considerada estacionamento, por essa razão, pode ou não ser regulamentada por meio de horário seguindo disposto no Decreto Executivo nº 072/2005. A questão de conflito, entretanto, não é a operação de carga e descarga, mas o estacionamento e a circulação das carretas no perímetro urbano.
Eis um impasse: se as carretas não podem estacionar na BR 364 por força de lei e não puderem estacionar na região central, onde elas ficarão? Essa é a questão importante do problema e foi cogitado até uma audiência pública para tratar do tema. Mas de uma forma ou de outra, essa discussão surge originalmente pela reivindicação com a segurança e para reduzir o número de vítimas que colidem em carretas estacionadas. A exemplo, no dia 17 de maio de 2019, um motociclista teve uma perna amputada ao colidir na traseira de uma caminhão estacionado no Bairro Jardim das Palmeiras. Cenas tristes como essa não faltam para exemplificar. Mas façamos um exercício de reflexão. Será se desaparecessem as carretas de um dia para o outro, todos esses acidentes seriam evitados?
Isso me reporta a um questionamento que sempre faço: quais as causas dos acidentes? Para responder essa pergunta, recorro ao site do Observatório Nacional de Segurança Viária, que especifica que apenas 5% dos acidentes são falhas mecânicas, 5% são falhas nas vias e 90% dos acidentes são falhas humanas, por imperícia, negligência e imprudência. Isso significa que muitos outros fatores podem contribuir com os acidentes que envolvem carretas estacionadas, a saber: excesso de velocidade, desatenção, ultrapassagem indevida, direção perigosa e/ou dirigir sob efeito de álcool.
Na madrugada do dia 20 de outubro de 2018, frente à Rodoviária, um motociclista morreu ao colidir contra a traseira de um caminhão estacionado. Será se a carreta não estivesse ali evitaria o acidente? Talvez. Menos de um mês desse ocorrido, no dia 13 de novembro de 2018, um motorista colidiu contra um poste de energia elétrica. Pensando desse modo, se não houvesse o poste de energia elétrica evitaria o acidente? Talvez. Mas se assim for, enquanto não houver a compreensão de que o problema maior está no indivíduo e não nas coisas, será necessário retirar as carretas, os postes de energia elétrica, as árvores, as placas e os muros. Pior ainda, o desprestígio aos caminhoneiros continuará, e isso não pode acontecer.
Por: Thiago Augusto
Servidor Público Municipal, acadêmico e escritor nas horas vagas