Temos ouvido o termo “cidadão de bem” ser usado com muita frequência nos discursos políticos e conquistado espaço até nos discursos religiosos. O Silas Malafaia que o diga, líder religioso e ativista político. Mas o destaque veio principalmente nesse último ano em que houve uma polarização muito inflamada pelo clima das eleições, que foi marcada por um ativo antipetismo e por uma afirmação de desejo por mudança e o “resgate” dos valores que supostamente estavam invertidos.
A impressão que se tem é de que o cidadão de bem é todo o indivíduo que julga a si mesmo como um ser direito, que se orgulha de pagar impostos e se orgulha de não matar e roubar, como se essas atitudes fossem uma qualificação para torná-lo melhor que o outro e não uma obrigação enquanto cidadão. Olhando por esse ângulo, parece muito fácil estabelecer um estereótipo de quem seja ou não cidadão de bem, e não é à toa que se vê num juiz a representação da justiça e num traficante de entorpecente a representação da criminalidade. É como se fosse uma classe social de pessoas que fazem o bem e outra classe de pessoas que praticam o mal.
Mas não ocorre ao nosso juízo que em um juiz pode praticar um ato mal e criminoso e um traficante pode fazer um ato justo e bom. Mas pensemos: a definição de o cidadão ser bom ou mal está relacionado às suas ações ou ao seu estereótipo? Se concordarmos que são as ações que determinam o quanto a pessoa pode ser boa ou ruim, devemos ressaltar que além de rogar direitos, a pessoa tem deveres a serem cumpridos. E se o indivíduo deixar de cumprir com seus deveres, ele ainda continua um cidadão de bem? Precisamos refletir sobre isso.
Vamos recorrer ao caso da agente de trânsito de São Bernardo do Campo, na grande São Paulo, que virou destaque nacional nos noticiários no dia 29 de março de 2019, ao autuar um veículo por uma infração de estacionamento, onde a mesma foi agredida por um casal que ocupava o veículo. Na delegacia, a mulher que desferiu as agressões se justificou com a alegação de que a agente de trânsito havia usado “tom de grosseria”. Veja bem, além da constatação da infração, houve o cometimento da agressão física. Quer dizer, o fato de haver um possível “tom de grosseria”, daria direito para apelar para tamanha violência? A mulher que agrediu, ela é uma cidadã de bem? Com certeza ela diria que sim, pois trabalha, paga as contas, não rouba ninguém e está grávida inclusive.
Vamos ao outro caso para complementar: um policial militar, sargento, foi preso nesta segunda-feira, dia 1 de março de 2019, por venda de um fuzil com luneta, para uso de atiradores de elite, no interior de um Shopping na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro. O policial militar foi preso com outros dois envolvidos, onde um já tinha passagem na polícia por tráfico de drogas. Insisto, o policial é um cidadão de bem?
Em Campo Novo do Parecis acompanhamos os casos de um agente prisional e um policial militar, ambos exonerados de suas funções públicas em virtude de atos ilícitos considerados crimes. O primeiro por se apropriar de R$ 100,00 de dois presidiários e o segundo por comercializar ilegalmente munições e armas para ladrões. Sem contar, que podemos supor para além desses casos concretos a reflexão sobre algumas situações: e se o juiz burlar a lei? E se o pastor usar de má fé? E se o médico negligenciar pacientes? E se o advogado cometer perjúrio? E se o policial assaltar bancos? Nestas circunstâncias, continuaria sendo fácil de estabelecer um estereótipo de quem seja ou não cidadão de bem?
Quem é cidadão de bem e quem é bandido? Vemos repetidas vezes cidadãos praticando o mal e cometendo erros e alegando ser de bem, mas são maus em seus atos maus, malvados cidadãos. Se assim for, é muito mais conveniente ser apenas um cidadão, sem etiquetas, sem estereótipos, apenas buscando fazer o que seja bom ao próximo e observando o que seja correto, afinal, somos todos iguais perante a lei.
Thiago Augusto
Servidor Público Municipal